- 9 de maio de 2023
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Líder protagonista, líder formador
Ser protagonista não é sobre fazer esforço de autopromoção ou escolher fazer aquilo que traz mais retorno individual com o objetivo de ser reconhecido como a estrela do projeto ou da empresa. É sobre cunhar e assumir o papel que for necessário para que os resultados aconteçam, é sobre fazer disso um exemplo que encoraja os demais a fazer o mesmo. No estado da arte, é sobre fazer isso de forma tão genuína que inspire!
Minha jornada de protagonismo
Considero a postura protagonista um dos valores mais importantes do Venturus, além de ter importante relação com uma mudança que introduzi na minha vida há alguns anos. Desde o início da minha carreira como desenvolvedor de software, busquei incessantemente descobrir qual papel profissional seria o caminho certo para me sentir realizado e motivado todos os dias.
Não bastava fazer um bom trabalho que me desse orgulho do que produzia, pois eu sentia falta de algo mais importante, de maior significado. Após uma década de tentativas e, sem encontrar a autorrealização, eu me senti cansado e desiludido e decidi tirar um longo período sabático para poder me dedicar exclusivamente à busca da minha “vocação”.
Experimentei profissões, empreendedorismo, cidades, perspectivas, trabalho voluntário. No entanto, quando meu dinheiro começou a acabar, fiquei muito preocupado e precisei tomar uma decisão que tivesse o poder de evitar que o problema de dinheiro acontecesse novamente:
Listei meus principais conhecimentos e habilidades e, ainda com as velhas dúvidas, escolhi me dedicar à carreira técnica dentro de desenvolvimento de software, pois o mais importante não era a escolha, mas a consistência do caminho sendo seguido. Dúvidas e tentações surgiram no caminho, mas eu lembrei do que foi importante na decisão e persisti.
A persistência e o tempo no caminho fizeram a profissão ter novo sabor. Alguns anos depois, realizado com minha carreira como desenvolvedor e como o líder técnico que me tornei, nomeei esta fase da minha vida de PROTAGONISMO.
Observei que um indivíduo pode alcançar níveis mais altos de autorrealização não quando finalmente encontra o que sempre procurava, mas quando finalmente faz a escolha de assumir a responsabilidade pelo seu papel nos resultados, seja no trabalho, seja na vida pessoal.
Viver esta história me inspirou a refletir sobre meus 15 anos de experiência liderando e formando equipes em projetos de natureza adaptativa. Percebi que aprendi muito com a riqueza da visão de mundo e da história de cada uma das pessoas com quem trabalhei.
A partir disso, construí uma ferramenta de liderança e desenvolvimento de pessoas que chamo de “framework de protagonismo”, que apresento abaixo e que está em constante evolução.
Um framework de protagonismo
O framework visa oferecer uma abstração coesa e relativamente fácil de lembrar, que pode ser incrementalmente assimilada e aplicada por líderes formais e informais, técnicos ou não. Ele possui enorme poder de alavancagem de produtividade e autodesenvolvimento no nível dos indivíduos. Em outras palavras, serve para formar profissionais protagonistas.
Para um indivíduo ou para uma equipe, acredito que um dos graus mais altos de abstração e que tem o maior poder é o porquê, o propósito. Neste framework, o líder deve adotar o protagonismo como o porquê da equipe. Ele deve frequente e regularmente refinar seu entendimento sobre o protagonismo no seu contexto, disseminar na equipe os exemplos concretos e reconhecer seus liderados quando atitudes protagonistas são tomadas.
O protagonismo como propósito é profundamente vinculado aos níveis mais altos de autorrealização humana. Ele é uma competência e, quando pleno, compõe com a autonomia e a resiliência o que talvez seja o mais alto grau de sofisticação da cognição humana. Dessa forma, servindo as necessidades humanas mais sofisticadas, é uma fonte de motivação bastante sustentável, eficaz e humanamente sensata.
O propósito é muito inspirador. No entanto, também são necessários elementos mais objetivos e concretos que guiem as ações dos indivíduos. Neste framework, o líder deve entender, refinar, disseminar e reconhecer constantemente os seguintes 5 elementos, como meio para desenvolver competências e formar uma cultura que as reforce e perpetue:
- Autonomia (intelectual e moral);
- Entregas frequentes e incrementais;
- Qualidade;
- Resiliência;
- Crescimento.
Entendendo os elementos do protagonismo
Mas, o que são esses elementos? Vamos a mais detalhes:
Autonomia
A AUTONOMIA é um resultado da capacidade de abstração. Por esta razão, é necessário oferecer experiências para criação de repertório e vivência. É importante notar que, embora a autonomia resulte em iniciativa, a presença de iniciativa não significa necessariamente que a raiz é autônoma. Por isso, os indivíduos devem ser estimulados a formar, progressivamente, visão crítica sobre os assuntos conforme são expostos a novas situações, como forma de estimular o desenvolvimento da capacidade de abstração
Nos tempos atuais, é muito comum que até os mais experientes e preparados sejam levados por opiniões superficiais que, pelo extremismo do meio ou falta de tempo de quem consome, sufocam e tomam lugar do que é de fato relevante.
Entregas
As ENTREGAS FREQUENTES E INCREMENTAIS tem dois objetivos:
- Reduzir o tamanho do ciclo de feedback e a granularidade das ações observáveis, permitindo ao líder corrigir e reconhecer com frequência se as atitudes estão refletindo o jeito protagonista de ser;
- Desenvolver e fortalecer nos indivíduos a capacidade de assimilar mudanças de rumo, tornando-os mais capazes de protagonizar resultados de sucesso.
Ou seja, um ritmo de entregas contínuas cria mais oportunidades de feedback e de assimilação de mudanças permitindo que os profissionais cresçam e inclusive passem a protagonizar esse processo.
Qualidade
Para fazer entregas com QUALIDADE, são necessárias diversas competências, mas quero destacar aqui o que considero ser o ponto de inflexão: alcançar a qualidade através do desenvolvimento de resiliência nos indivíduos.
Com ela, permite-se que eles protagonizem através da gestão de energia e das emoções, de forma a exercer o melhor uso do seu potencial intelectual para encontrar alternativas — e, com isso, em hipótese alguma, abrir mão da qualidade, porque a falta dela quase sempre é cobrada com juros no futuro.
Resiliência
Além da contribuição para a qualidade, a RESILIÊNCIA é parte indivisível do processo de ser protagonista.
No campo da psicologia, resiliência significa resistência ao choque, à adversidade. No entanto, o uso da palavra “adversidade” pode até descaracterizar a natureza da indústria de tecnologia e, possivelmente, de qualquer indústria global.
Lidamos diariamente com o ineditismo, com as mudanças constantes de requisitos, com mudanças de objetivos de negócio, com mudanças de código fonte, com a mudança de projetos, com a mudança de ambiente.
A mudança é prerrogativa de todos os envolvidos em tecnologia e não uma adversidade (eu gosto muito da palavra prerrogativa, que significa “vantagem de algumas pessoas por pertencerem a determinado grupo”).
Poder mudar (o código fonte, a funcionalidade parcialmente desenvolvida, o entendimento sobre o produto que resolverá o problema do cliente, abandonar um projeto que não está indo bem etc.) é a vantagem que temos por pertencer ao grupo que trabalha com tecnologia.
Sem mudanças, não existem projetos de tecnologia. Porém, ser resiliente exige gasto energético e é necessário que o líder nutra sua equipe com a importância e o significado do conceito mudança na área de tecnologia para que haja motivação suficiente. Os diversos cursos de liderança Ágil existentes abordam exatamente a gestão da mudança como tópico central para ser aplicado em equipes modernas.
Crescimento
Por fim — e de forma alguma menos importante —, o CRESCIMENTO.
O líder deve provocar cada indivíduo para buscar seu crescimento constantemente, além de oferecer recursos para isso. Eu considero que crescimento é o combustível essencial dos indivíduos de uma equipe, sem o qual não há resultados sustentáveis no médio e longo prazo.
Desenvolver-se profissionalmente, seja técnica ou comportamentalmente, contribui para o íntimo processo de autorrealização, para o qual estamos programados desde o DNA. O indivíduo protagonista busca o autodesenvolvimento e isso é inegociável quando se almeja resultados profissionais e pessoais no longo prazo.
O líder deve auxiliar sua equipe a desenvolver a habilidade de “aprender a aprender”. A partir dela, cada um deles poderá aprender com os erros, buscar aprimoramento constante, aprender a estar errado, aprender a ser protagonista e, mais importante, aprender e compreender que crescer é o fenômeno profissional que tem o maior poder de fazer com que a sua experiência no trabalho seja plena e gratificante.
O papel do Líder
Considerando todo o Framework proposto aqui, pode-se argumentar sobre a validade do esforço do líder para formar tantas competências e como forma de aumentar o desempenho individual dos seus liderados.
Ainda que seja bem aceita a ideia de que a motivação individual seja tarefa básica dos líderes, com menos frequência o mesmo princípio é aplicado à capacitação individual. É, sim, tarefa básica do líder atuar diretamente para o desenvolvimento da sua equipe, sendo esta umas das atividades de maior alavancagem que ele pode realizar.
Liderar é uma arte de muitas faces e uma das mais importante é liderar pelo exemplo. Como líder, não dê desculpas, mas assuma o papel que for necessário para que os resultados aconteçam. Sempre seremos reféns das circunstâncias, mas mestres das nossas escolhas.
Sendo assim, escolha o protagonismo como estilo e influencie seus liderados, seus pares e seus superiores. Desafie-se e desafie seus liderados, pares e superiores a fazerem o mesmo. O protagonismo é uma jornada sem volta, rumo à autorrealização. Que a sua jornada seja genuína e inspiradora.