- 4 de agosto de 2021
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Como as formas influenciam o Design
Muito se fala na psicologia das cores e como ela influencia nossa percepção do mundo à nossa volta. O amarelo traz confiança, vermelho traz energia etc.
Assim como as cores, as formas geométricas também influenciam a nossa vida mais do que pensamos. Uma pessoa antiquada é chamada de quadrada — não apenas em português! — e a boa cerveja “desce redondo”.
O design aproveita as formas em diversas áreas para conseguir os resultados desejados. O conhecimento sobre formas é aplicado a uma gama de situações, produtos e marcas de forma a transmitir a mensagem certa ao seu público-alvo.
Nesse artigo, vou falar um pouco sobre como as formas — mais pontiagudas ou arredondadas — nos afetam. Farei uma breve introdução à semiótica e discutirei a sinestesia e o teste “Kiki/Bouba”, que mostra como as formas nos influenciam.
Como os significados são atribuídos às formas?
Semiótica
A Semiótica é a disciplina responsável por estudar os signos e o processo de significação. Um signo é qualquer coisa que pode ser utilizada para representar algo. Esse “algo” pode ter um valor coletivo ou individual e seu significado pode ser diferente de acordo com a cultura, momento histórico ou experiência de cada um.
Certas civilizações, por exemplo, cultuam formas fálicas. Para elas, essas formas trazem o significado de fertilidade e prazer. Outras culturas as repudiam, pois acreditam que elas representam devassidão e imoralidade. Assim, o mesmo signo pode ser compreendido de formas diferentes, dependendo de vários fatores.
A construção dos signos e seus significados se dá com a evolução das civilizações. Embora a interpretação possa ser alterada conforme a cultura ou entendimento pessoal, essa significação é feita, geralmente, de forma inconsciente.
Assim, as conexões entre signos e significados podem ser estabelecidas de diversas formas — que ainda estão sendo estudadas por diferentes disciplinas. No entanto, é interessante observar a consistência de alguns destes signos, especialmente os ligados às formas.
Identificando significados que já estão presentes no imaginário coletivo de forma inconsciente, é possível usar formas e seus sentidos para transmitir mensagens.
A área de design aplica esses conhecimentos para desenhar produtos e experiências que comuniquem mensagens ao seu público-alvo de forma efetiva, mas mais sutil.
Sinestesia
A gramática descreve a sinestesia como uma figura de linguagem na qual associamos sensações de um sentido a outro. Para a neurologia, é um fenômeno pelo qual pode haver uma mistura sensorial. Por exemplo, existem pessoas que tem o paladar ativado pela audição.
Os neurocientistas Vilayanur S. Ramachandran e Edward Hubbard, da Universidade da Califórnia, defendem que o cérebro humano é naturalmente sinestésico. Por isso, resolveram aplicar um teste.
Desenharam uma forma arredondada e outra pontiaguda, chamando-as de “Bouba” e “Kiki”. Os participantes do experimento deveriam indicar qual das formas era “Bouba” e qual era “Kiki”, sem informações extras de contexto.
Qual das imagens abaixo você acha que é Kiki? E Bouba?

Kiki e Bouba
Se você as nomeou de Kiki e Bouba, respectivamente, você está junto da grande maioria. 95-98% dos testados por Ramachandran as nomearam dessa forma. Como se dá essa consistência em resultados? Os professores explicam que nosso cérebro vincula som, forma e imagem.
Quando você fala “Bouba”, o som sai mais suave, ou “arredondado”. O seu cérebro traça uma relação entre a palavra — Bouba — e a segunda imagem, mais arredondada, que compartilha as mesmas características.
Essa descoberta pode ter diversas implicações. Para nós demonstra que a visão tem a capacidade de influenciar outros sentidos. Por exemplo, já viu aquela almofada redonda e imaginou como ela deve ser macia?
As Formas
Retângulos
Retângulos transmitem a sensação de força, segurança e resistência. Pessoas antiquadas são chamadas de “quadradas”. Mas a verdade é que há empresas que adotam formas retangulares nos seus produtos e conseguem criar soluções modernas que transmitem robustez e firmeza.
Veja o site da IBM. Ele é todo montado utilizando o Design System deles, IBM Carbon. Seus elementos — fontes, barra de navegação, menus dropdown e botões — são todos retangulares. Isso conversa diretamente com a marca da empresa, que também traz ângulos, traços retos e nos transmite o sentimento de segurança, robustez e confiança.
Círculos
As formas redondas nos dão a sensação de conforto e são aproximáveis. Você não precisa de um círculo necessariamente. O iFood, por exemplo, arredonda os seus botões e ilustrações de forma suave, mas bastante eficaz. Comparando a interface do aplicativo com a da IBM, qual parece mais aproximável?
Triângulos
Triângulos trazem a sensação de movimento e velocidade, não apenas pelo visual, mas também por questões práticas, como a aerodinâmica. Nas interfaces, as formas triangulares dão sensação de continuidade.
Além disso, os triângulos também remetem ao perigo. Armas, munições, dentes, garras, agulhas e inúmeros objetos capazes de nos ferir apresentam formato pontiagudo. Por isso, essa forma também pode representar o perigo. Muitas interfaces utilizam desse significado ao emitir alertas.

Triângulos simbolizam perigo e cautela
Note que o símbolo de alerta do Windows, e outras interfaces, é similar a algumas placas de trânsito. O formato triangular, mesmo sem a leitura do conteúdo, já nos faz perceber que há algum tipo de perigo, nos colocando em atenção.
Conclusão
As formas são símbolos, por isso, são imbuídas de significado cultural. Há, na neurociência, estudos em andamento para entender como as formas podem ter influenciado a linguagem e outros campos. Esses estudos procuram identificar significados de formas que nem sempre são explícitos, mas que podem direcionar a percepção que o público tem — seja um produto, marca ou experiência.
Por isso, ao aplicá-las, é importante ter embasamento e análise. Como é possível observar nos exemplos, bons resultados podem ser encontrados quando as formas são bem usadas.
As formas são poderosas criadoras de significado, ainda que isto seja feito de forma mais sutil e implícita. São decisões muitas vezes consideradas menos importantes, mas que, na realidade, são essenciais no processo criativo e de design para permitir que a mensagem desejada alcance o público.